Os oceanos recebem anualmente 25 milhões de toneladas de resíduos. O Brasil entra com parte substancial: ao menos 2 milhões de toneladas por ano, o que daria para encher 30 vezes o Maracanã, do chão ao topo.

Os cálculos são de um estudo da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (Iswa, da sigla em inglês) e da sua representante brasileira, a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe). É a primeira vez que se chega a esses números, segundo Carlos Silva Filho, diretor da Abrelpe. A principal fonte de dados foi o Atlas Mundial de Resíduos da ONU, mas foram compiladas outras bases regionais, como no caso brasileiro.

“Os números do Brasil podem ser ainda maiores. Fizemos uma estimativa conservadora”, diz. Os 2 milhões de toneladas são o volume de resíduos que não têm coleta regular: 10% do total de resíduos produzidos anualmente no país.

Porém, no volume da coleta regular também está incluído o lixo doméstico que é destinado a lixões e aterros controlados, um total estimado em 30 milhões de toneladas. Instalados nas proximidades de rios e zonas alagadiças, esses locais deixariam escoar cerca de 3 milhões de toneladas ao ano para os cursos d’água —10% do que recebem. O caminho natural é dar no mar. Com esse acréscimo, o total brasileiro saltaria para 5 milhões de toneladas por ano.

A conclusão é que a falta de universalização da coleta e a permanência dos lixões são os maiores causadores da poluição marinha no Brasil. “Os lixões violam princípios básicos de direitos humanos, contribuem para a poluição dos recursos hídricos e desperdiçam mais de R$ 5,5 bilhões por ano para a recuperação do meio ambiente e o tratamento de problemas de saúde. Com menos da metade, o Brasil poderia fechá-los”, afirma.

Batizado de “Prevenção ao Lixo Marinho – Agora” o estudo foi lançado na última quarta, 21, dentro de uma iniciativa das associações de resíduos chamada de Força-Tarefa Marinha, que elenca ações prioritárias para o combate ao problema. O estudo mostra ainda que, embora haja forte contribuição da atividade pesqueira, dos transportes e do turismo, 80% dos resíduos que estão hoje nos oceanos vieram das atividades em terra.

Como ações imediatas, indica a universalização da coleta, o encerramento dos lixões, a recuperação de resíduos e materiais recicláveis de atividades de pesca, transporte e turismo e o combate aos pontos viciados de descarte irregular, o lixo que é jogado na rua ou nos rios. “Para esse último tópico, é preciso que haja política pública. A instituição de multa, por exemplo”, diz Silva Filho.

A Força-Tarefa Marinha atua em três frentes: apoio financeiro e coordenação de pesquisas acadêmicas para obtenção de dados e soluções de combate aos microplásticos, parcerias com municípios para gestão de resíduos e divulgação de informações e boas práticas para tomadores de decisão, através de uma plataforma digital, no momento apenas em inglês.

A prioridade ao lixo marinho decorre de três dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). O 14, que fala explicitamente em prevenir e reduzir significativamente esse tipo de resíduo, mas também o 11, que preconiza a criação de cidades e comunidades sustentáveis e o 12, que prega consumo e produção responsáveis.

Na apresentação ao estudo, o coordenador da iniciativa no Iswa, o professor Costas Velis, da Universidade de Leeds, na Inglaterra, aponta grandes “falhas sistêmicas” contemporâneas como causadoras da situação atual.

Uma delas é a falta de coleta: “Se os dois bilhões de pessoas sem acesso a uma coleta adequada de resíduos continuam a despejar muitos de seus resíduos diretamente nos ambientes aquáticos, nunca seremos capazes de eliminar a crise do lixo marinho”, escreve.

A outra decorre do consumo excessivo e da falta de reciclagem: “Se o desperdício de plástico não for evitado a montante, antes de se fragmentar, ele acabará se transformando em inúmeras micro e nano partículas, o que ultrapassará as nossas habilidades de controle”.

Velis cita ainda o que chama de “paradoxo da garrafa PET”: “O material que é o exemplo mais bem-sucedido de reciclagem em circuito fechado, a garrafa de PET transparente, é também um tipo abundante de lixo marinho”.

Mara Gama

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