Para diminuir a quantidade de poluentes lançada à atmosfera todos os dias, uma das principais apostas é a substituição das fontes de energia fósseis pelas renováveis, como a solar e a eólica. Essas tecnologias não geram resíduos durante o funcionamento, mas isso não significa que não causem nenhum tipo de impacto ecológico. As turbinas eólicas, por exemplo, representam um perigo em potencial a pássaros e morcegos. Já os painéis solares têm, em sua composição, materiais que podem ser danosos ao ambiente após o descarte. Embora esses impactos sejam muito menores do que a emissão do dióxido de carbono, cientistas buscam fontes energéticas ainda mais limpas.
Uma alternativa são os dispositivos biofotovoltaicos, que aproveitam a fotossíntese realizada por plantas ou algas para coletar a energia do Sol. Pesquisadores da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, fizeram um avanço considerável nessa área, cujas pesquisas são bem recentes. Eles criaram uma célula solar feita com algas que supera em cinco vezes a produção de energia de modelos anteriores. Detalhes da solução tecnológica foram apresentados, mês passado, na revista Nature Energy.
O dispositivo é dividido em duas partes: uma é responsável pela captação da energia solar, e a outra, pela transferência dessa energia para um sistema elétrico. A estratégia, portanto, permite o armazenamento do recurso. Porém, a célula criada pelos britânicos tem a densidade energética — quantidade de energia que pode ser extraída por metro quadrado — de apenas um décimo da atingida por painéis solares convencionais. Em contrapartida, como é inteiramente feita de algas, sua matéria-prima é mais barata e menos danosa ao meio ambiente. Além disso, a célula biofotovoltaica é capaz de produzir energia, mesmo durante a noite.
Segundo os criadores, o dispositivo pode ser bastante útil para regiões rurais e aplicações que utilizem pouca energia, como para alimentar sensores ambientais, mais ainda precisa ser melhorado. “Para melhorar a performance, nós precisamos entender melhor a biologia por trás do processo”, afirma Paolo Bombelli, um dos autores do artigo. “Isso inclui, por exemplo, saber por que as células de algas liberam elétrons e como esses elétrons saem do corpo celular.”
Esses processos ocorrem durante a fotossíntese. Os dispositivos biofotovoltaicos baseados completamente em organismos coletam o excesso de elétrons e o transformam em corrente elétrica, que pode ser usada para alimentar outros aparelhos. Todos os modelos desenvolvidos até hoje faziam esses dois processos em um único compartimento.
Já a versão apresentada pela equipe de Cambridge divide a célula solar em duas, criando uma série de vantagens. A coleta de energia deve estar exposta ao Sol, mas a área responsável por transformá-la em corrente elétrica, não. Dividindo os processos, os cientistas puderam otimizá-los independentemente, aumentando em cinco vezes a sua densidade energética em relação às versões anteriores de células biofotovoltaicas: o aparelho pode gerar 0,5 W por metro quadrado.

Baixa demanda

A produção, porém, é baixa e dificulta o uso da tecnologia em locais que precisam de muita eletricidade. “Nossos dispositivos provavelmente serão mais úteis para locais fora da rede de energia, nos quais pequenas quantidades de eletricidade podem ser muito úteis. Por exemplo, ela pode alimentar um sensor ambiental em uma floresta”, ilustra Bombelli, que segue listando vantagens. “Ele é mais barato de se fazer e descartar do que as células solares convencionais, tanto em investimento financeiro quanto energético. Também pode operar no escuro, usando metabólitos produzidos pelas algas em presença da luz.”
Leandro Manera, professor do Departamento de Semicondutores, Instrumentos e Fotônica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ressalta as limitações de uso da solução tecnológica. “O próprio artigo fala que ela não pode ser utilizada em muitos lugares.” Mas ressalta que esse é um campo recente de pesquisa, com muitas utilidades a serem exploradas. No ano passado, por exemplo, Manera orientou um trabalho de mestrado que utilizou uma abordagem diferente: a pesquisa adicionou a substância responsável pela fotossíntese a um painel convencional, aumentando a sua eficiência (Leia mais nesta página).
Os pesquisadores de Cambridge trabalham, agora, para desenvolver aplicações reais para a tecnologia. “Existem muitos desafios, alguns relacionados aos componentes biológicos e outros, aos componentes físicos”, afirma Bombelli. “Mas pretendemos continuar com a nossa abordagem, que é multidisciplinar. Esse projeto requer uma ação sinérgica de biólogos, físicos, cientistas de materiais e engenheiros.”

Turbinadas

Os pesquisadores britânicos utilizaram algas geneticamente modificadas para aumentar a eficiência delas. Além de ecológico, o material pode ser produzido facilmente e com poucos recursos, uma vez que os organismos se dividem sozinhos. Há modelos de dispositivos biofotovoltaicos que usam as plantas sem fazer esse tipo de intervenção.

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